sábado, 27 de agosto de 2011

Tributo a Dona Ana




Tive a felicidade de conhecer Dona Ana do Mocambo em 2004. Ela foi uma pessoa de grande importância em minha vida. Dona Ana nasceu e viveu todos os seus 92 anos na comunidade rural do Mocambo, em São Francisco, no Norte de Minas. Ali sonhou e trabalhou a vida inteira para transformar para melhor a vida em sua comunidade.
Teve 12 filhos. Todos cresceram vendo Dona Ana buscar água em vasilhas na cabeça, apanhada em corgos e cacimbas, como se diz por lá. E em distâncias medidas a quilômetros, para suprir as necessidades da família e da casa. Foi uma grande líder em sua comunidade, uma referência de liderança social e espiritual para dezenas de outras comunidades naquele Norte das Gerais.
O pessoal da Extensão Rural daquela região conheceu muito bem Dona Ana. Tinham respeito e admiração pelo seu trabalho, sua liderança, sua luta diante dos desafios que o Norte oferece com fartura à sua gente. Astolfo, Carlão, Zé Ricardo Roseno, Harildo, Marcão e dezenas de outros colegas da Emater-MG já estiveram com ela no Mocambo, sentiram a força de expressão e de esperança que Dona Ana demonstrava em ações e demandas que fazia com firmeza, dignidade e ciente dos direitos sociais devidos às pessoas de sua comunidade e de todas as comunidades rurais de Minas e do nosso Brasil.
Logo em nosso primeiro encontro, num trabalho da Extensão Rural no Mocambo, Dona Ana, sabedora de que ali estava o presidente da Emater-MG, foi franca e direta como sempre foi. Me disse: “Meu filho, tudo isso que a Emater faz é importante,é muito bom... Mas, ninguém aqui tem água dentro de casa para beber, para viver.Meu filho, não esqueça da Agua para nossa vida".
Era uma senhora de mais de 80 anos, uma agricultora familiar, uma mãe de família numerosa, uma senhora que raras vezes saíra de sua comunidade, que nos dava a todos essa lição fundamental de extensionismo rural, de direitos de cidadania, de luta incessante pela dignidade da pessoa humana.
Nascia ali, com as palavras de Dona Ana, o Projeto de Abastecimento Comunitário de Água para comunidades rurais, que nós extensonistas rurais colocamos e executamos dentro do Programa Minas Sem Fome, do Governo de Minas Gerais. Era o ano de 2004. A primeira comunidade rural a receber a água foi a do Mocambo, em São Francisco, terra de Dona Ana. Hoje, cerca de 45 mil famílias rurais do Norte de Minas e do Jequitinhonha conquistaram através desse projeto o direito à água tratada dentro de suas casas. Melhorou bastante as condições em que essas famílias cumprem seu sagrado trabalho de produzir alimentos para todos nós.
E era isso que eu queria dizer. Que Dona Ana, que faleceu nessa sexta-feira, 26 de agosto, deixou esse legado à extensão rural e aos agricultores familiares. O desenvolvimento rural sustentável começa pelo atendimento dos direitos de cidadania das pessoas, pelo respeito à dignidade das famílias que vivem e trabalham no meio rural, produzindo o alimento que nos garante a vida de todos nós.
E para mim, deixou o legado da Causa de vida e o sonho de erradicar o mal da falta de Agua para as pessoas do semi árido mineiro. E o título de Moises do Sertão...

A notícia da partida de Dona Ana me alcançou em trabalho no Vale do Jequitinhonha. Parei um momento para sentir toda a extensão de minha saudade e gratidão devida a Dona Ana. Era uma agricultora familiar e viveu a vida inteira na comunidade do Mocambo, em São Francisco, no Norte de Minas.
Devemos muito a Dona Ana. Fica para nós seu exemplo de luta, de esperança e de trabalho solidário na construção de uma vida melhor, com justiça social e direitos assegurados para a dignidade humana.
Obrigado Dona Ana.Sua sabedoria nos ensinou que água é vida.

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